sábado, 17 de junho de 2017

MISOGUI



O texto de hoje foi publicado originalmente no blog AIKIDO IMPRESSÕES (veja o post original aqui) em 17/022014. O autor é Daniel Daniel Nicolau que é Arquiteto, Servidor Público e na época era faixa-preta 1º Dan (Shodan) da Academia Central de Aikidô de Natal. As imagens não são as do posto original. Boa leitura!
O sensei Daniel Nicolau ministrando uma aula

AIKIDO PARA O DIA A DIA




Nas primeiras aulas de Aikido, recebemos várias explicações básicas sobre o funcionamento dos treinos, técnicas, etiqueta no tatame, entre outras. É natural que, ao longo da permanência do aluno nos treinos, a curiosidade comece a aumentar e que passemos a ler sobre aquilo que aplicamos nas práticas. Sensei fala – Aikido é para o dia-a-dia, exercício para o corpo e disciplina para a mente. Esta frase parece mais um simples jargão clichê que poderia ser aplicado a todas as formas de se exercitar ou mesmo outras artes marciais, mas nos parece que esta máxima é um pouco mais profunda na bela arte do “caminho para a harmonização das energias”.
Para sustentar esta afirmativa lembramos que, dentre muitos princípios que doutrinam a arte aikidoca, há um que nos dias de hoje nos parece um dos mais importantes, inclusive para o aprendizado e desenvolvimento dos outros princípios. Este é chamado Missogui, que significa: “a prática para remover a poluição (Kegare) do corpo, da mente e do espírito (…). Missogui é o primeiro conceito do Xintoísmo esotérico. É o Missogui aquilo que cria espaço dentro do indivíduo para que ele possa entrar em conexão (Mussubi) com o mundo divino.[1]
Abrir espaço para algo dentro de nós nos dias hoje é tarefa muito difícil, principalmente na sociedade ocidental, cada vez mais capitalista, consumista e desumana. E é neste ponto onde encontramos o maior presente que a prática do Aikido oferece. Um bom sensei irá levar o aluno à pratica do missogui no tatame mesmo sem que ele perceba. No entanto, quando o fazemos de forma consciente ele é muito mais proveitoso e eficiente. “Aikido é o exercício de estarmos sendo ensinados pelos Kamisama (divindade), sobre as vibrações da criação universal (tamashii)”.[2] É preciso estar aberto a estes ensinamentos para recebê-los em sua plenitude.
Para entrarmos no estado onde possamos nos harmonizar com a energia universal e ao aprendizado do Aikido, precisamos nos abrir e sermos propensos a receber. É aí que começa o exercício interno verdadeiro.

Exame de Sandan (3º Dan) na Academia Central de Natal em novembro 2006


A prática do Missogui pode ser realizada de diferentes formas e ao longo de todo o dia. Algumas formas são mais ritualísticas, ligadas à religião e outras mais mundanas. Neste texto, não entraremos em detalhes sobre a ritualística Xintô, pois o nosso objetivo é justamente dar uma pincelada no que a segunda prática pode gerar de benefícios ao praticante de Aikido.
A etiqueta cobrada dentro do tatame e a presença do sensei, já nos convidam a doutrinar a mente para fazer uma pausa no nosso dia e descansar das preocupações. A “ritualística” da aula, o respeito pelas explicações e o treino do que é ensinado buscando imitar os movimentos da forma demonstrada nos leva a um estado de concentração que começa a limpar nossa mente de outros pensamentos, problemas, preocupações, etc.. A concentração “forçada” nas técnicas de queda, principalmente quando estamos como Uke, leva a aflorar nosso instinto de autopreservação que acaba por ajudar a retirar de nossa mente pensamentos ruins. Então o Missogui acontece. Começamos a retirar de nós tensões, asperezas e preocupações e, ao fim de um bom treino, começamos a ver tudo de forma diferente, com a mente mais tranquila e o corpo mais relaxado. Somos até capazes de julgar melhor os motivos de nossas apreensões e tomar decisões mais centradas.
Qual a mágica? Não há mágica, há perseverança, disciplina, disposição para o aprendizado e consideração mútua. Para que ocorra uma aula proveitosa que nos permita praticar o Missogui, é preciso que estejamos dispostos a ceder e a se por no lugar do outro enquanto nage, respeitando as condições físicas e mentais dos nossos colegas de treino. É necessário também que quando Uke, estejamos prontos para sermos flexíveis e perceber a condução do nage, condução esta que pode ser encarada como uma analogia para as formas que a vida nos apresenta as mais variadas situações.
De nada servem as correções e as explicações individuais se não houver espaço mental e humildade para recebê-las. A limpeza interna abre espaço para o aprendizado e para os bons sentimentos de todos aqueles que partilham o dojo conosco. Devemos nos sentir gratos pelas oportunidades e por toda a doação que encontramos no sensei e nos colegas de treino.[3]
Concluindo esta exposição, lembro a frase de Kisshomaru Ueshiba parafraseando o Fundador, “a ressonância do corpo deriva da unidade mente-corpo que se harmoniza com a ressonância do universo”[4]Para que esta ressonância seja positiva e possamos nos beneficiar dela, precisamos estar no estado adequado para dar e receber. O Missogui é uma prática que nos leva a purificar-nos e abrirmos espaço para aprender a receber, sabendo conscientemente o que e como. E para nós, este é um grande diferencial da prática do Aikido das demais atividades físicas e artes marciais e um grande exercício para toda vida.
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Referências:
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[1] BULL, Wagner José. Aikido-caminho da sabedoria. A Teoria.Editora Pensamento, São Paulo. Pg 181 e 182.
[2] Idem
[3] SUNADOMARI, Kanshu. A iluminação através do Aikido. Ed. Pensamento. São Paulo 2006. Pg. 107 a 109.
[4] UESHIBA, Kisshomaru. O espírito do aikido. Ed. Cultrix. São Paulo, 1984.
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Colaboração:
www.impressione.wordpress.com

Imagens: Divulgação
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