sábado, 1 de março de 2014

ARTES MARCIAIS E DEFESA PESSOAL

Passeando pela net, fui surpreendido com um texto muito interessante de autoria de Carlos Munindra, publicado no Recanto das Letras. As imagens foram incluidas apenas para divulgação. Boa leitura !

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Artes Marciais e Defesa Pessoal


A busca da serenidade e o cultivo da intenção treinar a mente e o corpo a fim de que gerem harmonia
Defesa Pessoal é um assunto polêmico, em razão das lendas e mitos sobre artes marciais e a mescla de aspectos filosóficos, religiosos e de práticas correlatas como o conhecimento de anatomia, noções de química, de instrumentos bélicos, formas diversas de curar e de matar, hipnose, ilusionismo, invisibilidade, dissimulação etc.
Apesar dos tabus envolvendo as artes marciais, a defesa pessoal especificamente refere-se à prática de exercícios simples e de fácil assimilação, que permitam preservar a integridade física e vital da eventual vítima de ataques.
Cabe lembrar que em defesa pessoal não há regras a cumprir, logo vale tudo, no entanto, deve ser ressaltado também que estamos em uma sociedade civilizada e, sob a égide da lei, aspectos éticos e morais. Desta forma, é de pacífico entendimento que todo mal causado a outrem, que não o seja motivado pelas excludentes de criminalidade, poderá advir em prejuízo tanto ao agressor quanto, digamos, ao “defensor” que se exceder no evite da injusta agressão contra si ou terceiros.
Aproveitamos o ensejo para desmistificar a idéia errônea que se tem de arte marcial como sendo desenvolvedora de violência, pautado no mal exemplo de alguns desviantes,os quais envergonham as tradições de respeito ao próximo, de autocontrole e da busca da paz.
As artes marciais visam superar a força com inteligência, tecnicidade e variabilidade de procedimentos. Para tal é necessário anos de treinamento. Um curso rápido de defesa pessoal é incapaz de preparar alguém sem bases específicas para defender-se.
Algo em que alguns artistas marciais dentre os mais experientes pecam e que deve ser reforçado como premissa das artes marciais é a necessidade do treinamento intensivo e incansável do autocontrole. Trata-se do objetivo final e primordial ao praticante das artes marciais. Vê-se muita intenção de destruir por aí. Muita idéia de medo incutido e de que existe um monstro prestes a devorá-lo e, desta forma todos os seus músculos e intenções devem estar atentos para destruí-lo. Alguns pregam que, segundo eles próprios dizem: ”infelizmente antes o atacante do que eu”.
Não estamos no mundo da fantasia e a violência existe, mas a idéia de poder e destruição alheia somente gera mais violência.
Não estamos preparados para tudo. Temos que ter ferramentas de administração física e mental de conflitos, causando o menor mal possível.


Temos que nos contrapor aos selvagens urbanos.
Caso seja necessário agir, mais eficiente e dissuasória será uma técnica que surpreenda e deixe o adversário desorientado e pensado em como aquilo (a defesa) foi realizado. Quando você machuca gravemente alguém gera apenas ódio e sentimento de vingança.
A partir da aquisição do autocontrole o artista marcial deve buscar a melhoria infinita do equilíbrio entre sua mente, seu corpo e seu espírito.
Quem tem autocontrole sobre si mesmo estará mais preparado para enfrentar o descontrole de situações reais (e aceitar as perdas de que não se tem controle).
As situações reais apresentam um dinamismo e diversidade que não são alcançados apenas pelo treinamento físico realizado em artes marciais, sendo necessário muito exercício de concentração.
Há que se procurar vencer pelas atitudes coerentes, palavras adequadas, adiando o conflito para situações em que não haja alternativa e, mesmo assim, caso seja possível, devemos nos valer de todas as capacidades verbais e não-verbais, a fim de que o conflito sequer se inicie.
Em aulas de defesa pessoal que ministramos, constatamos que os alunos revelam-se pasmos ante a eficiência de técnicas, as quais parecem pouco eficientes aos seus olhares desconfiados até que as executem por si mesmos, pois não exigem força ou energia excessiva para realizá-las, o que contrária seu nível de testosterona ou ímpeto juvenil. Ao realizar os movimentos e lhes ser dito que se devem primar pelo aspecto técnico e verificar a eficiência, sempre ouço uma exclamação surpresa e uma alegria, quando o aluno se apercebe de um conhecimento novo o qual não fazia parte de seu cotidiano.
A surpresa e a alegria se dissipam de imediato, quando, ao perceberem que estão sobrepujando o colega de treinamento, resolvem abandonar a serenidade e utilizar a agressividade (lembremos que agressividade difere de agressão ou violência e é elemento essencial à sobrevivência humana, sendo que todo ser humano a tem em certo grau).
Neste momento reitero que a serenidade deve ser treinada incessantemente, pois quem se demonstra afoito em uma situação controlada, perderá totalmente o controle em uma situação real e caracterizada por fatores adversos como: níveis de adrenalina do opositor, demência, força e técnica muito superiores à sua,
Em todos os casos apresentados sua finalidade é sobreviver. Para sobreviver temos que amainar nosso coração e buscar o desejo de sobreviver, mas para tal devemos afastar a intenção de matar ou destruir o atacante, pois Carl Gustav Jung adotou para a psicologia a premissa de que “toda ação implica em uma reação de mesma direção e sentidos opostos”.
Serenidade implica em serenidade como resposta, mesmo que haja a quebra de paradigmas do opositor e este passe por um conflito (ou dor) até e perceber o caminho equivocado o qual trilha.
A intenção nunca deve ser a de destruir, mas de fluir as energias por um caminho de ausência de embate, de conflitos, de briga, de demonstração de forças, de superação, de vaidades ou poderes.
Com certeza o caminho proposto amainará os ânimos do atacante, que, se persistir em resistir, terá sua resistência quebrada.
Os conceitos filosóficos propostos anteriormente se explicam no mundo ocidental pela teoria da resistividade, ou seja, quanto mais áspera uma superfície, maior resistência haverá à continuidade do movimento de um corpo que traça um caminho sobre esta superfície. A superfície é o caminho o movimento são os conflitos. O caminho é trilhado pelas nossas mentes que nos iludem com falsas percepções da realidade. Quando conseguimos sentir e nos manifestar de modo adequado conseguimos polir nossas mentes e trilhar o caminho sem conflito ou resistências. Quando a superfície torna-se lisa o bastante todos os corpos que mantiverem contato com ela passarão a realizar um MRU (movimento retilíneo uniforme). Neste caso deixa de haver conflito entre os corpos e as massas consideradas e tudo passa a fluir livremente.
Cabe ressaltar que o conflito é elemento típico da natureza (os elementos químicos estão em infinito conflito criando substâncias e condições de subsistência da vida planetária: é o caos benigno).
Todo conflito mal gerenciado pode advir em consequências maléficas. Polir a mente para permitir o MRU pelos caminhos da vida é a solução.
O treino de artes marciais busca treinar a mente e o corpo para realizarem o MRU nas relações interpessoais e grupais e quando indissociável o conflito decorrente e, obter resultados benéficos destas relações, mesmo que se tenha que recuar.
Nos casos extremos em que haja necessidade iminente de preservar sua integridade física e vital, que serão raros, deve-se buscar como intenção básica, impedir a continuidade do conflito. O objetivo é que as ações resultem em harmonização.
Em último caso, haverá quebra dos paradigmas do oponente, causando-lhe desconforto, dor ou malefícios, mas por culpa de sua própria insistência como opositor, o qual descumpriu regras insertas nas leis universais.
Cabe ao defensor preservar sua intenção inequívoca de não causar, de forma alguma, mal ao opositor.
Em outra oportunidade falaremos deste e de outros aspectos de arte marcial e defesa pessoal.

Carlos Munindra

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