domingo, 18 de setembro de 2016

A Espada Japonesa – Exemplo Máximo de Qualidade

A Espada Japonesa – Exemplo Máximo de Qualidade 


(Érico de Barros Kehne)
Em 1542, quando os mercadores e navegadores portugueses, os primeiros ocidentais a pisar no Japão, chegaram em Tanegashima, uma ilha na costa sul de Kyshu, depararam-se com dois elementos que os impressionaram sobremaneira: a casta dos samurais e o “verdadeiro espírito” desses – a espada (ou katana) japonesa. Apenas os samurais (a palavra “samurai” vem do verbo clássico japonês SABURAU, que significa “servir”) estavam autorizados a usar as duas espadas – a longa, ou katana e a curta, wakizashi. Esse par constitui o chamado daisho.

Os séculos XII e XIII foram considerados a grande era dos fabricantes japoneses, como Muramasa e Masamune. Acreditava-se que a própria personalidade do fabricante se incorporava à espada. Dessa forma, Muramasa, que era um fabricante de grande perícia, mas possuidor de uma mente violenta e desequilibrada que chegava à loucura, transmitia às lâminas que forjava uma verdadeira sede de sangue, enquanto Masamune, tranqüilo e digno, também transmitia essa dignidade às lâminas.
Reza a lenda, que as espadas de Masamune
se recusavam a cortar qualquer coisa sem motivo, inclusive o vento
O processo de fabricação das katanas reveste-se até hoje de um caráter espiritual e de grande complexidade. Dessa maneira, o mestre espadeiro deve iniciar seu trabalho com uma purificação mental rigorosa e, só então, iniciar a forjadura da lâmina. 

Tudo começa com a obtenção de aproximadamente três quilos de minério de ferro, provenientes de uma mina específica, localizada no Japão. O primeiro estágio da fabricação da espada é a fundição do minério e a sua moldagem na forma de um bloco retangular sólido, ao qual é afixado uma espécie de cabo bem comprido, que depois será retirado. O bloco é batido na bigorna até ficar achatado. Essa peça achatada pode ser coberta de palha ou mergulhada numa solução que remove as impurezas do metal. Ainda aquecida ao vermelho, ela é fendida na metade com um formão bem duro e dobrada sobre si mesma, de modo a assumir novamente um formato retangular. É recolocada na fornalha e o processo é repetido milhares de vezes. Esse processo de dobrar, bater e redobrar dispõe o aço em camadas finíssimas, semelhantes às de um compensado de madeira. O temperamento acontece depois que a lâmina já foi achatada e formada com um lado mais fino, o qual será, ao fim do processo, o fio da espada. O metal é aquecido a uma temperatura exata, que só o mestre espadeiro consegue avaliar, pela cor que a lâmina assume ao fogo. É mergulhada então num líquido frio. Os dois lados da lâmina são agora de espessuras diferentes; por isso se expandem e se contraem em proporções diferentes, dando à lâmina curvatura característica. O temperamento também endurece o exterior da lâmina (o hamon), mas deixa o interior (a parte média ou shinogi) com dureza mediana e a parte curva (ou mune) mais macia. Com isso, ela se torna menos frágil, ligeiramente flexível e com um enorme e futuro poder de corte. 
A sede de sangue de Muramasa
A lâmina está, agora, pronta para ser polida. O polimento é feito à mão, com pedras naturais de cerâmica, cada vez menos ásperas, até que a superfície fique semelhante a um espelho. Por fim, a lâmina é afiada. Materiais nobres são utilizados na confecção das demais partes da katana; assim, por exemplo, o tsuka (ou parte que forma a empunhadura da espada) e o saya (a bainha da katana), devem ser confeccionados à mão, em carvalho japonês. Além disso, o tsuka deve ser revestido com pele de raia oceânica (raia samê), o que garante durabilidade de até duzentos anos. Além do uso prático, as katanas japonesas feitas por mestres espadeiros conceituados, são vendidas por alto preço (as mais simples variam de 6.0 a 15.0 dólares), podendo chegar a mais de 150.0 dólares (vide site w.nihonto.com) e são consideradas um excelente investimento, chegando mesmo a serem guardadas em cofres de banco.

Érico de Barros Kehne é médico, professor de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e um estudioso e praticante de lutas marciais japonesas. Este texto foi encontrado na Revista Sinergia- União Brasileira para a Qualidade , ano 6 nº 30 ,em fev/março/2007. As imagens foram incluidas como divulgação.

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