Porque as mulheres devem treinar com as armas.
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Diane Skoss |
Para muitas mulheres, a defesa pessoal é, pelo menos, uma das razões para procurarem uma arte marcial e a maioria delas, pelo menos em minha experiência, escolhem uma luta desarmada, como o AIKIDO, o KARATE ou o JUDO (estou me limitando às artes japonesas porque é nelas que reside a minha vivência.
Deixo aos peritos nas artes de outros países verificarem se estas observações são igualmente válidas para elas).
Artes armadas que incluem KATA, praticadas em dupla, como o KENDO, o NAGINATA, ou o JODO, não são normalmente consideradas como veículos para o aprendizado da auto defesa-
Afinal, qual vantagem em aprender como se defender com um Naginata de 7 pés de comprimento, se é muito improvável que você o carregue consigo todo o tempo?
Professores competentes em quaisquer dos caminhos marciais japoneses modernos evitam prometer aos seus alunos técnicas defensivas instantâneas e totalmente eficazes. Eu costumava explicar que o valor verdadeiro do AIKIDO não era ensinar técnicas para reagir, mas inculcar uma postura e um modo de se posicionar que desestimulam o ataque, uma vez que a pesquisa tem demonstrado que as vítimas são geralmente escolhidas pelos predadores com base em sua aparente vulnerabilidade. A competência técnica, aliás, leva anos e uma intensa dedicação ao treinamento para se desenvolver.
Você provavelmente imagina que uma portadora do 4º Dan, com mais de dez anos de prática em AIKIDO e cerca de 1 ano e meio em JUDO se sentiria razoavelmente segura de sua competência. Bem, não é como eu me sentia! Face à compreensão de que, quanto mais eu treinava, mais crescia a minha responsabilidade em dividir um pouco do que eu aprendera com outras mulheres, eu me via forçada a conferir, permanentemente, as minhas habilidades. O que eu descobri foi dúvida. Não da variedade pequena, mas do tipo tão grande que era, na prática, quase certeza: Se a pressão se transformasse em um empurrão, eu simplesmente não saberia o que fazer ou como me sairia ( apesar da minha experiência prévia de combate no dojo). O que me fez pensar: onde eu havia falhado em meu treino?
Cinco anos depois e após sete anos de treinamento com armas (JUKENDO, TAKENDO, JOJUTSU E NAGINATAJUTSU), creio Ter achado a resposta, pelo menos o que me diz respeito. Não fora o que eu falhara em meu treinamento, mas meu treinamento que falhara comigo. Por várias razões, o treinamento desarmado não fora tão útil como o treinamento com armas para me ensinar o essencial para a defesa pessoal. Hoje, sinto uma plena confiança que se for atacada, poderei e irei reagir, com uma razoável possibilidade de sucesso.
Ora, porque as artes armadas funcionaram tão bem para mim? Bem, algo que aprendi, durante o meu treinamento em AIKIDO. Apesar das alegações dos instrutores ("Vejam: os fracos podem vencer os fortes!"), é que, ao treinar com homens do mesmo ou de maior nível que o nosso, a força conta. E muito... Claro que o nosso objetivo último é não usar a mera força física e sim a aplicação precisa e relaxada da quantidade estritamente necessária de força, na direção certa, no local certo e no momento certo. O problema é aprender "como". As mulheres costumam ter mais facilidade para isto, uma vez que a nossa maneira de ser é menos condicionada psicologicamente à nossa força física mas mesmo quando fazemos "a coisa certa", é comum descobrirmos que não conseguimos aplicar com precisão técnicas desmarcadas em homens maiores e de igual competência.
Esta variação em "potência", mesmo quando sabemos que estamos executando a técnica melhor que os rapazes, pode provocar muita frustração. Tudo que aprendemos é que quando a pressão se transforma em um empurrão. Você tem que ser muito, MUITO boa, para vencer um adversário mais forte. Isto faz com que não tenhamos muita confiança em nossa habilidade em defesa pessoal.
A luta constante contra a força e a frustração pode também nos desviar do estudo dos detalhes sutis que são a verdadeira chave para as técnicas eficientes de defesa e nos envolver com a noção falsa de "FAZER AS TÉCNICAS FUNCIONAREM". Relembrando os meus tempos iniciais ao AIKIDO, vejo que o que eu aprendia eram sequências magnificas e muitas vezes belíssimas de movimentos, os quais eu podia aplicar facilmente contra alguém menor ou menos competente do que eu. Mas o que me fazia falta era um vocabulário totalmente internalizado de princípios que pudessem ser imediatamente consultados e aplicados, de forma a que eu pudesse responder a qualquer situação e a qualquer oponente. Creio ser esta a principal vantagem a ser obtida com o treinamento com armas.
Como então isto funciona? Em primeiro lugar, qualquer arma é uma grande equalizador, "um multiplicador de forças". Subitamente, diferenças de alcance, peso e altura, não importam tanto, mantida a constante da arma. Mulheres armadas tornam-se, de repente, tão fortes como homens. Não é necessário muito poder muscular para aplicar um golpe mortal com um "jo"(bastão médio) - o que se faz necessário é uma compreensão do que chamo "padrões de princípios".
Demonstração do por Meik (com a lança)& Diane Skoss (com a naginata) no Nippon Budokan, em 1997.
Embora os princípios de relaxamento, observação, senso de distância, iniciativa, linha e trajetória, tempo, equilibrio, foco e vontade, fossem muito falados, em vários graus, nos Dojo de Aikido nos quais treinei o que na verdade praticávamos a maios parte do tempo eram "padrões de movimento". Descobri que "padrões de princípios" são muito fáceis de ver, sentir e analisar no treinamento com armas. A trajetória de uma arma em movimento rápido é especialmente apropriada para demonstrar princípios. Por exemplo, ao enfrentar um oponente portanto um Jo, é fácil perceber quem controla a linha central. A posição da ponta de ataque do jo do meu adversário, em relação ao meu corpo, é clara: se estiver apenas um centímetro fora do centro, eu terei boas possibilidades de me desviar e contra-atacar.É claro que isto é igualmente verdadeiro no caso de um adversário desarmado, mas a percepção correta daquela linha, que não é tão óbvia, requer tempo significativo de prática.
Distância e tempo, ou Maai, também são mais fáceis de perceber e internalizar quando trabalhamos com armas, especialmente aquelas do comprimento de uma espada ou maiores. Ficamos fisicamente mais afastados do nosso oponente em uma distância crítica para engajamento em combate (Maai), que é uma relação claramente definida, visível e relativamente consistente entre as pontas das armas.
Nas artes desarmadas, o Maai se define pela possibilidade relativa de alcançar o adversário (e pela velocidade necessária para tal), variando dramaticamente de um encontro para outro.
Pode levar anos até que o aluno aprenda a captá-lo no curto espaço de tempo necessário para cobrir a distância. Embora existam também variações de distância, em função de tamanhos e proporções corporais, quando usamos armas, elas são normalmente minimizadas pelo tamanho constante da própria arma e o fato de que simplesmente levamos mais tempo para cobrir a distância maior. Aprender a fazer julgamentos apurados, pode ser refinado pelo trabalho com armas, em várias combinações, algumas com Maai intrinsicamente diferente, como por exemplo usando um Kusarigama contra uma Naginata ou um Tanken contra um Juken. Quando a sua compreensão da relação entre uma arma específica e seu Maai se torna intuitiva, não é muito difícil se adaptar a situações imprevistas. Em minha experiência, efetivamente, a variação constante de distancia nas artes desarmadas torna muito mais difícil "sentir" o Maai. Pode também produzir uma padronização imprópria "por razões didáticas" que leva à crença rígida que "esta técnica só pode ser feita desta maneira correta", uma visão totalmente equivocada dos princípios de aprendizagem e de como aplicá-los.
A habilidade de observação pode ser aguçada mais rapidamente e com melhores resultados, em minha opinião, através da prática com armas. Nada como uma espada de treino conectando com a sua cabeça ou uma lança de nove pés lhe atingindo nas costelas para lhe convencer a prestar atenção total a cada dos movimentos do seu oponente.
A possibilidade de atingir ou ferir assistentes (ou ser atingido enquanto esperamos a nossa vez de treinar) é também muito maior na prática armada. Os praticantes rapidamente desenvolvem "antenas" de 360 graus.
Embora a percepção e a atenção sejam uma parte essencial de todas as artes desarmadas que eu conheço, as consequências da sua falta sempre me chamaram a atenção como muito mais dramáticas nas artes armadas. Não sou tão precipitada para sustentar que TODOS os princípios úteis de defesa pessoal só podem ser aprendidos da prática com armas. Obviamente, os desequilíbrios (KUZUSHI) são muito melhor compreendidos na prática do Judo ou do Aikido. Nem pretendo que se treine, exclusivamente, com armas. Todos precisamos saber como lutar no chão e ter, pelo menos, conhecimentos rudimentares de luta agarrada e de traumatismos (ATEMI).
O que proponho é que alguns anos de um bom treinamento com armas, antes da prática de alguma luta desarmada, podem encurtar o tempo necessário para que as mulheres (ou homens, bem entendido) alcancem o nível no qual poderão, com confiança usar suas habilidades para a sua auto-defesa.
Após escrever este artigo, tive a oportunidade de comprovar um aspecto importante dos fatos aqui expostos. Na demonstração de 1997 do Santuário Meiji, em novembro, fui convidada a demonstrar Toda-Há Buko-Ryu Naginata Jutsu. Ao iniciar a demonstração, meus pés escorregaram na grama e eu caí. Meu pensamento imediato foi: "Tenho que sair daqui depressa, porque este é um péssimo lugar para ficar". Num movimento único, me levantei, me esquivei do corte descendente e contra-ataquei com outro corte. Embora aquela situação não fosse uma de vida ou morte, a minha reação mostrou a minha habilidade em agir corretamente e sem atraso que são ambos importantes elementos ao lidar com uma ataque real.
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